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Ex-diretora-executiva do "O Boticário" largou tudo pra ser estagiária em uma floricultura.



Conheça a história de Andrea Mota, ex-diretora de O Boticário, que largou uma carreira brilhante em busca de qualidade de vida

Com diagnóstico de síndrome de burnout – “pane” causada por pico de estresse –, a então big boss da marca resolveu mudar drasticamente de vida. “Não quero mais ser executiva. O preço é alto demais”, diz a nova estagiária de uma floricultura


Andrea Mota largou tudo pra ser estagiária em uma floricultura (Foto: Daniel Katz)


"Dezembro de 2013. Era o meu 5o ano como diretora-executiva de O Boticário. Gerenciava quatro diretores, 700 funcionários, mil franqueados e uma equipe indireta de 25 mil pessoas. Bom, vocês imaginam o quão estressante era esse período de fim de ano, época de pressão máxima pra bater metas. Estava exausta! Sentia meu corpo e minha mente no limite: insônia, tontura, mau humor, tremores faciais... os sinais de estresse estavam ali, escancarados. Mas, ok, nada de novo no front, afinal havia aprendido a lidar com todo tipo de pressão. “Você sempre deu conta, só precisa de férias”, repetia pra mim mesma. Porém, daquela vez foi diferente.

Nem a viagem de férias me fez melhorar. Bem pelo contrário. No dia 11 de janeiro de 2014, estava com o Natan, meu marido, e meus filhos, Caio e Izadora, na Bahia – moro há 13 anos em Curitiba, mas sou baiana e tenho casa lá –, e acordei com uma dor de cabeça infernal. Minha mente parecia mais acelerada que o normal, não sei explicar ao certo. Também não conseguia levantar da cama. Fiquei lá, tentando descansar, e o Natan levou as crianças à praia. Não queria que elas me vissem daquele jeito. Mais tarde, quando já estavam todos de volta, meus braços, do nada, paralisaram. Entrei em desespero! “Estou tendo um derrame!”, gritei. O Natan ligou correndo pra minha irmã, que é médica e nossa vizinha de condomínio. 

Já no hospital, após uma bateria de exames, veio o diagnóstico: síndrome de burnout. É uma doença dos tempos modernos, caracterizada por um estado máximo de exaustão física, mental e emocional devido ao acúmulo de estresse. Assim: o organismo recebe um excesso de estímulos tão grande que os neurotransmissores simplesmente param de fazer sinapses. Tipo uma pane. Por sorte, a minha foi leve. Gradativamente, tudo foi voltando ao normal com a ajuda de remédio pra dormir e antidepressivos. “Mude de vida. Reduza o ritmo, faça terapia, se exercite, cuide mais de você”, recomendou o médico.

Exatos nove dias depois do surto, já estava em Curitiba, de volta ao trabalho. Foi um dia horrível. Lembro-me de ter sentido medo das minhas reações, já que pela primeira vez na vida não estava no controle. Tive uma longa reunião com o Artur [Artur Grynbaum, presidente do Grupo Boticário] e com a diretoria pra explicar o ocorrido – fui o mais transparente possível e pedi compreensão. Todos concordamos que eu reduziria o ritmo: na prática, passei a ser mais seletiva com os compromissos e diminuí o número de viagens. Além de continuar com os remédios, montei uma superequipe pra me ajudar a reduzir o estresse: psicólogo, personal trainer, coach, homeopata, massoterapeuta. Tinha ao meu lado o time mais incrível do mundo, mas não fazia ideia de como, de fato, mudar meu ritmo. Veja bem, durante a minha gestão, a empresa cresceu três vezes mais que o esperado e se tornou uma das marcas mais admiradas do País. Só pra dar um exemplo: as metas traçadas pra 2018 foram alcançadas em 2014. Ninguém consegue tamanho sucesso com uma dedicação mais ou menos. É preciso comprometimento, paixão. Por isso, jornadas de trabalho de 14 horas por dia são inevitáveis, assim como um terceiro turno, viagens internacionais, mil eventos e jantares com clientes. Ser bem-sucedida é incrível, mas o preço que se paga é altíssimo. 


Nem durante a gravidez considerada de risco (por ser de gêmeos), Andrea diminuiu o ritmo no trabalho (Foto: Divulgação)


Acho que o que mais dói quando se tem uma top carreira é que o tempo pra família é quase nulo. Via os meus filhos coisa de duas horas por dia. Se me sentia culpada? O tempo todo! Mas sou de uma geração que aprendeu que a mulher tinha que ser independente a qualquer custo e que o trabalho árduo era o único caminho pro sucesso. Tinha esses valores tão incrustados em mim que mantive a rotina frenética até durante a gravidez, considerada de alto risco, já que era gemelar e eu tinha 37 anos. Os gêmeos, frutos de uma fertilização in vitro, nasceram prematuros e ficaram 28 dias na UTI. Quase morri de felicidade quando eles puderam ir pra casa. Lá, ganharam peso e tamanho, e voltei ao serviço no final do terceiro mês – dali em diante, sempre contei com a ajuda de ótimas cozinheiras e babás, além do Natan, que é um supermarido. Como ele é advogado, tem uma agenda flexível e mais tempo pras crianças.

Bom... Mesmo reduzindo o ritmo e tentando de tudo, o fato é que eu não estava mais feliz no trabalho. Era hora de encarar a realidade: já havia construído o meu legado e aquela vida já não me bastava mais. Precisava me reinventar, sabe? Adquirir novos conhecimentos, quem sabe começar uma outra carreira... Com isso, parei, fiz as contas e comecei a me planejar. Em outubro de 2014 (acho até que aguentei bastante!), comuniquei aos chefes a minha decisão de me desligar da empresa. As reações foram as mais diversas, da surpresa à raiva, mas segui decidida e segura da minha decisão. No dia 5 de janeiro de 2015, dei meu adeus definitivo. Hoje, com 46 anos e orgulhosa da minha coragem, finalmente aceitei que não sou uma máquina. Sou de carne, osso e emoções e tenho apenas duas certezas na vida: não quero mais ser executiva e quero ter tempo pra mim. Continuo com a minha psicóloga na tentativa de me conhecer melhor e achar uma nova carreira. Até lá, estou fazendo cursos de culinária, fotografia e ioga, e em breve começo o estágio em uma floricultura. Adoro poder levar meus filhos ao cinema à tarde. É como dizia o poeta italiano Torquato Tasso: “Perdido é todo tempo que com amor não se gasta”.

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